quarta-feira, 31 de março de 2010

Meus (dez)oito anos.

É diferente e inusitadamente igual. É essa forma como o tempo passa, essa forma através da qual todas as outras pessoas o enxergam e classificam. É também e inevitavelmente essa minha mania de (quase) nunca estar entre todas as outras pessoas, como se a cada simples pensamento padrão, eu pudesse encontrar uma forma alternativa de pensar.
E essa passagem ininterrupta dos dias, das semanas, dos meses e anos, essa passagem contínua de vidas que cruzam outras vidas e separam-se, isso me assusta como acontece com as coisas que também me fascinam.
E eu continuo passando.
E às vezes, recolho alguns fatos, alguns dados, algumas memórias e alguns pequenos acidentes casuais, para preencher minhas brechas e falhas imensas - impossíveis de preencher. E me formo, me reformo com todos eles enquanto os recolho como pequenas florzinhas à margem dos caminhos que me arrisco ou me obrigo a seguir.
E eu continuo seguindo.
Porque eu conheço pessoas que estão sempre cercadas de outras pessoas - e por estarem cercadas, permanecem sozinhas. E conheço pessoas que não perderam nenhuma daquelas festas que eu me permiti perder, e hoje me sinto mais encontrada do que todas elas jamais estiveram. É que a partir de alguns estalos - de alguns instantes raros de consciência súbita e plena - nós vamos aprendendo que estar quieto é também uma forma de encontro; e vamos entendendo aos poucos, que estar em paz é uma dádiva que nenhuma agitação se torna capaz de substituir. Porque há sempre um tipo distinto de paz para cada ser que existe.
E eu continuo existindo.
Mesmo sabendo que meus olhos não se fecham facilmente depois dos meus dias ruins, depois das fases quase escuras, depois do que me dizem sem pensar, e depois das pequenas mágoas que me alcançam quando eu esqueço de correr. E às vezes questiono por que continuar correndo. Se é mesmo nas mágoas, se é bem mesmo no centro das dores, que surge algum tipo de salvação. Se é exatamente no momento em que me desamparo e desespero, que algo ou alguém me resgata - com um sorriso e algumas daquelas palavrinhas mágicas, junto do abraço e do meu coração. É na hora em que me deparo com o risco, que a segurança me levanta nos braços e caminha alguns passos comigo.
E eu continuo caminhando.
De mãos dadas com a sorte, às vezes com ele, e sempre comigo mesma. E até quando confundo as direções dos ponteiros de uma bússola que, supostamente, eu deveria carregar, eu acabo esbarrando com qualquer aviso que me indique o rumo certo. E não, não é sempre o destino. É também o que (pouco habilidosamente) eu faço com ele.
E eu continuo fazendo.
Porque sei que bem no fundo de mim mesma, hoje há menos barreiras do que houve há semanas ou minutos atrás. Bem no fundo de mim mesma, há aqueles desejos incontroláveis que eu jamais poderei satisfazer completamente. E da mesma matéria que nascem esses desejos, nasce a minha fé. No amor, nas pessoas e nos meus passos, um depois de outro. Porque dos meus desejos, sei eu, sou eu, cuido eu e me mantenho eu. Meus desejos são eu.
E eu continuo sendo. Sempre, agora. E a cada instante um pouco mais.

sexta-feira, 26 de março de 2010

E essa é a graça.


Para Eduardo J.


É que você sabe de coisas que poucas pessoas sabem.
E antes que eu soubesse exatamente o que escrever, você seria capaz de imaginar que eu, de fato, não saberia.
Porque você sabia que eu iria tentar escolher as palavras certas - e porque palavras certas não existem, você sabia que a cada tecla e a cada sílaba eu me atrapalharia mais e mais, por tentar te surpreender. E para você, enfim, não será nenhuma surpresa.
Você sabe de coisas que poucas pessoas sabem. E talvez esta seja a sua melhor parte. No entanto, veja só, eu acho que você nem percebe. E essa é a graça.
Fica permanentemente escrito nos seus gestos, no seu sotaque, nas suas preocupações, sentidos, medos e perspectivas. Fica escrito nas gírias do seu vocabulário. E a sorte acontece quando quem está por perto consegue ler. Quando você (ocasionalmente) aceita permitir que te leiam.
E porque você me permitiu, eu li coisas que jamais irei escrever.
E serei sua amiga até quando todas essas coisas começarem a desbotar, para pintar cada uma delas novamente, nas tintas que combinarem melhor. Ou para costurá-las, tão forte e tão apertado para que nunca se soltem, e para que você seja sempre (e sempre) você.
Porque dos prólogos aos epílogos, a sua história vale mais que muitas das vidas que as pessoas comuns costumam ter.
E você sabe de coisas que poucas pessoas sabem.
Que seu coração não somente te pertence. E que não somente bate assim tão perto, porque bate também em lugares tão distantes que você não consegue supor. E sabe que há laços que não desatam depois da vida. Tanto quanto sabe que está atado àquela espécie inevitável de amor - aquele amor que não cura, aquele amor que só Sara(h).
E das coisas que poucas pessoas sabem, das coisas que apenas você é capaz de saber, eu desejo que você tire suas respostas, e construa com elas sempre novas perguntas. Para que não deixe de procurar, buscar e querer. E para que encontre - seu lugar, seu refúgio, seus planos e até você mesmo.
Eu assistirei você, e assistirei a você. Serei a 'ajeitadora' dos seus ternos, protetora dos seus segredos e admiradora dos seus atos.
Mesmo porque 'se eu não fosse tão sua amiga', haveria muito menos honra, muito menos orgulho e muito menos fé do que hoje existe em mim.
Apenas seja também. E apenas saiba.
Há uma existência inteira esperando por ti.

domingo, 21 de março de 2010

Pelo que você é.

Parecem muito felizes, curtindo este momento. (...) Lua beija Marie. É só um beijinho de leve nos lábios. E ela retribui o beijinho.
Às vezes as pessoas são bonitas.
Não pela aparência física.
Nem pelo que dizem.
Só pelo que são.
(Markus Zusak)


É o sorriso que você dá quando ninguém está esperando que você sorria. E é como você se ajeita na cadeira para ser mais suportável esperar por alguém. É também no seu tropeço e na mão que segura na ponta da mesa antes que você desabe.
É o sussurro que você dá durante aqueles cinco ou dez segundos que vão durar sua vida inteira.
E é a maneira menos dolorosa que você encontrou de trancar suas lembranças naquela gaveta. São suas camisetas preferidas que se gastaram enquanto você acreditava que trouxessem sorte. São suas fotos e cartas e papéis e chaveiros sem par. É a sua expressão de cansaço diante de milhares de compromissos inadiáveis, que te fazem guardar seus melhores planos para depois.
É o dia em que você acorda para fazer tudo de uma maneira diferente, ainda que sejam as mesmas tarefas numa ordem um pouco menos comum.
É o ritmo que se acelera quando você encontra exatamente o que buscava sem nem mesmo tentar perceber - dentro do armário, nas páginas de um livro, ou dentro do seu coração.
E é a posição em que você adormece mais rapidamente, cercada pelo silêncio de ouvir um mundo inteiro ao seu redor. E é o reflexo que faz seus olhos ficarem mais escuros, como se as estrelas houvessem saído de lá. De lá para outros olhos.
É tudo isso e é aquilo tudo também. Um pequeno instante em que se acende um brilho, reluz e se apaga. É quando a beleza acontece.
Não pela sua aparência física (e que se decepcionem as pessoas superficiais, porque estarão sempre flutuando sem se aprofundar).
Não pelo que você diz.
Mas pelo que você é.