sábado, 23 de janeiro de 2010

E eu mudo quando chove.

É tão engraçado o quanto dói sentir a mim mesma diante das coisas. É quase uma condição inerente de ser, então apenas sou. Mesmo que essa dor de estar sendo me pareça um estado permanente , entre vários outros estados temporários que se alternam.
Há aquela quase felicidade, que antes de me parecer um porto, mais me parece uma bóia que flutua cada vez que tenho medo de me afogar. Há aqueles instantes raros de alegria extrema, que quase me consomem pela espera e pela raridade. Há também o amor, que droga e que graça, há o amor que me destrói e fere e cura e prende e liberta. Há os olhares que correspondem aos meus, e há aquela cor que fez meus olhos mais castanhos por uma ou duas vezes na vida. E há, sempre, a própria vida, que parece se estender à minha frente, como se eu somente estivesse a alguns passos da partida - mas que, timidamente, também me esconde onde fica a chegada. Eu, que não tenho pressa de chegar.
Há, nessa ordem embaralhada, tantas, tantas coisas, que eu jogaria sem repetir cartas, e talvez até vencesse algumas rodadas.
Mas, de repente, há aquela dor de ser. Esta que me espiava sorrir, para depois doer. Então me contraio. Como tudo o que vive e se contrai. Essa dor de elástico, que vai e volta, que aperta e relaxa. Involuntária. Eu, que não a controlo, apenas (de susto) percebo, eu observo o quanto um dia ela foi incômoda.
É que ser, não dói a todo mundo. E tudo aquilo que é incomum, nos espeta a princípio. Até que o mundo (quase) todo se torna previsível demais, de forma que até mesmo algumas dores nos ajudam a escapar do óbvio. Então mesmo que eu saiba que pessoas em geral não doem - e que pessoas em geral não olhariam para si mesmas muito profundamente, para não correrem o risco de arranhar sua superfície envernizada - mesmo assim, sou quase amiga da minha dor.
E sinto pena sem precisar disfarçá-la de solidariedade. E sou solidária quando me considero forte o bastante. E tenho forças para suportar e prosseguir e (o mais pesado) para perdoar. E perdoo como se nunca houvesse lido Schopenhauer e suas ideias de que caráter não se muda. E eu mudo quando chove.
Difícil é compreender. E permitir que os outros não saibam do que se trata. Que os outros aceitem as misérias do mundo, sem reparar que significam também suas próprias misérias. Difícil é sustentar-se em órgãos e membros, e sentir falta de qualquer abrigo mais leve, para o caso de precisar voar.
É cansativo conviver. Pessoas supostamente corajosas, que pensam estar desafiando o mundo, e que esquecem que, visto de fora, o mundo não é desafio. O mistério é ver de dentro. E para ver de dentro é preciso primeiro estar aberto. Contrair-se. E doer.
É que isso, que em palavras pode soar como uma tristeza silenciosa, em matéria não é nada que se possa ver ou tocar. E faz um barulho que quase ensurdece. Sendo meramente um dos meus sustos, uma de minhas dores em outro dos meus textos.
Foi para dividir o que sinto? Não sei. Não estou bem certa, porque eu erro também. E ser um pouco egoísta com as minhas sensações, as mantêm mais perto de mim. Encaro melhor como uma doação, de uma pequena fraçãozinha dolorida, para (a princípio) te espetar também.
Você aceita. Se assim quiser.

3 comentários:

  1. Que delicia passar por aqui... tô adorando ler seus textos!!!

    Um beijão flor

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  2. O mundo é lindo,para os sonhadores mais que um sonho,por isso dificil desafiar o mundo,já que ele não está aqui para ser desafiado, a melhor coisa e deixar a tristeza de lado,no máximo transforma-la em texto e viver =)

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  3. Para mim a chuva trás alegria e renovação. Trás também lembranças do meu amor.
    É engraçado os diferentes tipos de sentimentos que a chuva jorra nas pessoas.

    ::)

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