quarta-feira, 23 de junho de 2010
Chuva
Ela que estava há alguns muitos minutos mais do que uma hora sentada. Sentada e quieta, aparentemente em paz, tentando suprimir a agitação imensa que se acumulava por dentro. A xícara de café exageradamente quente já havia esfriado em cima da mesa à sua frente, e ela nem mesmo havia bebido a metade, porque no fundo não gostava de café quente demais. Por alguns muitos minutos mais do que uma hora, ela se sentia aquecida por si mesma, vendo o café esfriar. Até ouvir aos poucos alguns pingos de água ferindo o chão no terraço. Um, outro e mais outro. E de repente aquele cheiro se desprendendo da terra no jardim, e aquele som de quando todas as coisas do mundo parecem ser uma coisa só. Estava começando a chover. E ela parecia despertar dizendo:
- Preciso sair.
- Sair para onde? Agora, assim, na chuva?
- Não sei para onde, só preciso ir lá fora. Na chuva.
- Você que adoece sempre, vai acabar se resfriando.
- Tudo bem - ela disse enquanto pegava as chaves e parecia correr um pouco mais leve indo até a porta, ela que por dentro estava tão pesada - eu vou mesmo assim.
- Vou pegar uma toalha para quando você voltar, então, e...
E ela já havia fechado a porta.
Era estranho que naquele momento ela não precisasse da autorização de alguém. Enquanto o céu chorava acima dela, tudo parecia ter muito mais sentido, muito mais razão. Se sentia lavada e, de alguma forma, se sentia compreendida. Aquilo parecia empurrá-la mais para dentro de si mesma - de onde nos últimos dias ela havia tentado fugir. Por aqueles minutos a chuva era dela, o mundo era dela. Ela, que se culpava por estar sentindo demais, agora se encorajava a sentir. A cena lhe parecia estranhamente com uma redenção, um pedido. E, lentamente, palavra por palavra, ela pediu. Sentia-se abrindo mão. Sentia-se aberta e agora não doía sentir-se assim. Só precisava atestar, pronunciar, permitir para a chuva que... permitir que sim.
- Sim, pode levar isso embora de mim.
sexta-feira, 18 de junho de 2010
Paciência
Saramago
quarta-feira, 16 de junho de 2010
Enfim
sexta-feira, 4 de junho de 2010
Me faça rir
Essa saudade repentina de ser sua amiga nem é mais tão repentina assim. De repente é você e o seu abraço. E nele a sensação de estar protegida do mundo, dos outros e dos meus próprios medos. Eu que nunca precisei saber se suas mãos encaixavam nas minhas, porque os abraços encaixavam e isso já era tudo. Então de repente é aquele dia em que você virou a esquina da minha rua correndo, minutos antes de eu entrar no carro e você não me encontrar mais. E aquela sensação de final de filme, correndo até você, e mais uma vez o seu abraço. E de repente é também aquela tarde de quinta-feira, e são seus olhos nos meus, enquanto eu tentava te falar coisas tão importantes e não conseguia fugir dos meus próprios comentários sobre o tempo. Por que o tempo? Isso era fugir de mim, para conseguir fugir sempre até você. Para não precisar dizer como era seguro o mundo ao seu lado. Para não admitir aquela vontade enorme de cuidar de você, de resolver seus problemas, e de guardar sua amizade numa caixinha com um laço no meu armário - e poder abrir e te tirar de dentro quando sentisse vontade. É que naquela época, eu não sabia que você já estava dentro de mim. E agora eu, que nunca admiti completamente a sua presença, eu não consigo me acostumar a ter você ausente. Não me acostumo a não te ter. E agora é meio tarde mas eu precisava que você soubesse: são pensamentos dos quais eu já nem fujo. É sempre e apenas você, dizendo: Larissa, me faça rir. E nós dois, enfim, conseguindo rir juntos. Sou apenas eu. Assumindo gostar tanto, tanto, tanto, do meu riso junto ao seu.