segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Insônia


Insônia. Esse presente que as almas voltadas à arte simplesmente acolhem como um dom. Sentam-se à varanda com papéis amarelados e uma xícara com café, e escrevem com perfeição aquilo que eu gostaria de ler em noites como esta. As almas voltadas à arte conseguem escrever o que nos salva. Lamento não ser artista, nem ter preparado café. E enquanto isso as almas voltadas à arte estão provavelmente tocando piano, e não possuem a vizinhança sonolenta e melancólica que eu conheço. Provavelmente há um pequeno e romântico vilarejo de pianistas insones. Há também um tocador de fole que mudou-se recentemente para lá - porque é preciso haver alguém ainda mais artista que enfrente a própria arte. E deve haver também uma reunião noturna de pintores, que não estão necessariamente pintando a essas horas, mas apenas porque lhes falta uma maior incidência da luz. A de dentro ou a de fora, tanto faz. Esses pintores conversam sobre as novas tendências de vanguarda? Também penso que não. É mais provável que comentem sobre como um deles adoeceu novamente. Ah, mas são esses ares... artistas sempre precisam respirar variações novas do oxigênio que nós mortais inspiramos sem reclamar. E nem estou reclamando, porque também penso carinhosamente a respeito de novos ares. Sairia imediatamente para buscá-los, mas minha insônia é preguiçosa e me consome. Preciso ficar quieta. Então escrevo supondo a madrugada desses meus artistas fantasmas, seus incensos, suas flores murchas esquecidas, suas salas elegantemente desordenadas, seus móveis empoeirados com a inércia de criatividade acumulada. É tudo enigmático, embaçado, difuso, mas incrivelmente lindo. Que a insônia abençoe essas almas que talvez sequer existam, mas que parecem inegavelmente vivas dentro de mim. Essas almas que despertam insones comigo, e me apresentam um mundo cuja porta está sempre destrancada. Eu preciso apenas empurrá-la.

7 comentários:

  1. Você não precisa de insônia, nem de café, nem de nada pra escrever bem. Isso é um dom que você tem, e uma prova disso são esses textos tão maravilhosos que você posta. Ta de parabéns.

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  2. Algumas portas sempre estão destrancadas, esperando o toque suave de uma mão desconhecida pra abrí-las... Agora que você tomou conhecimento, está na hora de agir.

    Os poetas e insones do lado de cá andam ao montes... Dormir fisicamente eu durmo, mas psicologicamente não... Há muito cansaço aqui.

    Foi bom te ler novamente.
    E perdão... sei que estou em falta no In.diferente. Sinceramente, não sei o que se passa... na verdade, nada se passa. Esse é o problema.

    Um beijo doce .

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  3. É um mundo tão lindo que há na gente, não é? Bem mais que inspiração, um refúgio, na verdade. O seu é lindo, tenho que confessar. :)

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  4. Bom dia Larissa!
    O que você escreve me teletransporta para outros lugares, outras datas, outros sabores...

    Te abraço com carinho!

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  5. pode ficar com aquela frase, rs
    o passado sempre tão presente...
    beijo!

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  6. Santa insônia. Lembrei de Chico Buarque: http://4.bp.blogspot.com/_8-NCNby5G_I/S-zANDhJo5I/AAAAAAAAAKU/S17RlMsGPoY/s1600/chico.JPG

    Bom conhecer seus escritos e suas neologias.

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  7. Não tome cafeína.
    Ou quem sabe..aproveite a falta de sono..com algo criativo..e prazeiroso.
    beijo

    Faxina

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