Meu amor. Todas as palavras bonitas que hoje eu gostaria de enviar-lhe já foram escritas. E não pretendo repeti-las, pois bem sei que a previsibilidade é ama de leite do teu tédio. Penso agora em coisas novas, coisas boas, coisas mudadas. Mudar é quase sempre preciso, às vezes até fundamental, bem sabes. Então costuro neologismo a neologismo, para entregar-lhe um cobertor de palavras em retalhos reformados, recortados de nossos panos velhos e puídos - que costurados, são, portanto, novos. Para que te aqueças do frio de minha ausência. É madrugada e não estou ao teu lado. Não estou, aliás, em meio a ti, como sempre costumo estar quando madrugamos e preciso sentir que estamos vivos. Não estou me aninhando como me ensinastes a aninhar. Mas sinto intuitivamente que teus pés devam estar cruzados por sentirem falta de atar-se aos meus. Mas não te preocupas, o dia já vem. Vem logo e vem tão claro e tão certo. Espera. Que com o dia eu também vou, bem sabes. Aliás: sabes de tudo, não é? Há muito rompemos a época de expor mistérios fundos, das vísceras das nossas almas. Já faz tempo que meus mistérios se dissolvem nessa água salgada dos teus olhos. Essa que me corta quando escorre por um corte teu. Mas é que teu mar nos olhos ondula muito menos que o meu, que tanto flui, que tanto foge, que tanto inunda. E são teus dedos que já recolheram minhas lágrimas, que estremecem meus milímetros ao passear nas trilhas que em meu corpo desenhei para ti. E se nelas te perdes, eu digo que teus sentidos se encontraram com os meus. Estamos atados, enlaçados. Ou sinto assim, e sinto sempre. Nas vésperas ausentes em que te espero ansiosa e quase pareço perfumar o ar para que te sintas bem recebido e voltes sempre. Então nunca desapareça, nunca me esqueça - que eu te imagino dizendo: não te esqueço jamais. Enquanto te envio vibrações amorosas, o mundo dorme. E não apenas porque seja tão tarde. As pessoas estão adormecidas mesmo enquanto acordadas, e tu também reparas, eu que sei. E é quando te agradeço por impedir minha própria inércia de vida - que talvez seja a maldição mais comum às criaturas humanas. Eu te agradeço por varrer a poeira sob meus pés, e conduzir meu movimento a um estado de permanente felicidade flutuante. Eu flutuo e assim não tropeço. Eu flutuo e tu me trazes de volta ao chão quando preciso, mas me levas pela tua própria mão que, há anos, me parece a mais firme e elegante de todas as mãos. Tu iluminas o tempo, quando o tempo é de cinzas. Clareias meus pensamentos, quando minha mente se encolhe no escuro. Tu enfeitas com flores os meus canteiros, quando a estrada é de tijolos secos. Trazes melodia ao ritmo sob o qual mantenho meus passos, e caminhas comigo quando meu medo é de nos perder. Eu emendo teus atos, teus fatos, teus gestos, teus sons, teus rostos, tuas rotas, teus traços, teus pontos, teus sinais. Emendoassimsemespaços, sem-vírgulas. Eu te emendo a mim. E escrevo-lhe enviando palavras que me soaram doces, nessa sinestesia que apenas teu coração entenderá. Escrevo-lhe e assim escrevo a mim mesma, pois que já fomos emendados há algumas frases (e tempos) atrás. Escrevo-lhe porque já estás contido em tudo. E porque tudo, enfim, me parece estar contido em ti.
Anônima, seu comentário foi respondido na postagem anterior, alguns comentários abaixo do seu.
ResponderExcluirEu acho lindo essas cartas escritas como surpresa entre namorados.
ResponderExcluirÉ como uma forma de tentar tocar a pessoa sem estar presente. Sem contar que essas cartas sempre chegam para quebrar aquele silêncio cortante onde há saudade. Meu beijo!
PS: Devo aproveitar aqui para lhe agradecer por sempre se preocupar em fazer um comentário no mínimo razoável sobre meus textos. Isso é um ato de respeito seu que eu admiro e me felicita muito.
"Escrevo-lhe porque já estás contido em tudo. E porque tudo, enfim, me parece estar contido em ti."
ResponderExcluirE depois você vem me dizer que o meu texto que foi bom? Lindas, doces e suaves palavras. Como sempre.
Adoro vir aqui e me encher dessa sua ternura.
Muito obrigada pelo último comentário, não tem noção de quão feliz eu fiquei.
Muito obrigada mesmo querida e parabéns por esse seu dom MARAVILHOSo ;)
Ah, que carta linda!
ResponderExcluirDaquelas que a gente lê e tem vontade de escrever uma igual. Melhor, que a gente lê e tem vontade de receber uma!
Muito amor aqui e descrito do jeito mais lindo!
Beijão Lari =*
Meu Deus, que coisa linda. Tem sentimento em cada palavra, em cada vírgula. Apaixonante Lari! =)
ResponderExcluirbeeijo.
Quando uma pessoa parece ser o encaixe perfeito para suas formas. Lindo. Lindo e lindo.
ResponderExcluirVou fazer possível e impossível pra enviar sua carta amanhã, ainda tenho de escrevê-la.
Beijo, querida.
''Escrevo-lhe porque já estás contido em tudo. E porque tudo, enfim, me parece estar contido em ti.'' não imaginas o quão lindo ficou esse texto, tanto amor passaste nele, tanta vida e paixão. amor em cada linha, é tão bom ler textos assim. seguindo tá? um beijo
ResponderExcluirMas que carta mais linda, hein? Quisera eu receber uma dessas. Logo no começo o estilo da tua escrita me prendeu e adorei o resto todo, parabéns.
ResponderExcluirAcho que todos nós:
"...bem sei que a previsibilidade é ama de leite do teu tédio"
Já tô seguindo e vou voltar sempre.
=*
Vc escreve divinamente bem! Parabéns!! Seu Blog é simples mas tem conteúdo!
ResponderExcluirAdorei seu Blog estou te seguindo!
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"Eu te emendo a mim. "
ResponderExcluir*----* Adorei aqui.